instituto projetos ambientais, em revista

Planejamento Urbano - é possível uma sinergia entre o social e o ambiental nas (mega) cidades?

Subsídios à complexidade de pensar as questões das cidades e suas expansões



     Ab’Sáber (2009) referenda uma proposição fundamental para a sinergia e qualidade no urbano, com suas indicações, estudos, legado:
     "Projetar o espaço construído só é possível com o entendimento do espaço natural. E essa questão é absolutamente intrínseca ao trabalho atual dos planejadores. Ao entender o que acontece no espaço natural é possível projetar o futuro e medir suas conseqüências - afinal, é no futuro que existe a obra construída, assim como o impacto causado na cidade e em seus habitantes."

     Historicamente, o Urbanismo Sanitarista, retratado por Campos Filho (1936) produziu o saneamento de áreas inundáveis, insalubres, a abertura de vias e vielas sanitárias no meio de quadras, a canalização de esgotos e águas pluviais, que, especialmente nos bairros e regiões periféricas (ou de baixa renda, operários), reproduzindo uma legislação urbanística de orientação compulsória e traduzindo limitações que criaram desproporção entre a existência de áreas verdes, em muitos casos, próximas de mananciais e de nascentes de águas.
     Este o legado herdado no presente. O profissionalimo, também compulsório, resultou numa realidade conturbada, exposta a intempéries e a situações precárias ña ocupação de áreas não vocacionadas à moradia. Exige uma complexidade traduzida nas equipes de trabalho e de re-engenharia das cidades.

Exemplos de usos ambientais nas cidades:
- O consumo per capita de água recomendado é de 150 L/hab.dia; mas o usual flutua entre 200 e 250 (em alguns bairros e épocas ainda maior). Só multiplicar por 18 milhões para uma cidade como São Paulo = consumo de água diário pela cidade = x 30 será mensal.
- A produção de lixo é média de 1,5 Kg por hab.dia - também é só fazer o produto (use o exemplo da sua cidade).

     Partindo para estudos complementares, destaca-se a questão das cidades e o debate que circundou a elaboração da Política Nacional de Habitação no Brasil, ao longo do ano de 2004, tendo como partida a criação do Ministério das Cidades ocorrida no ano anterior. A Política Nacional de Habitação (PNH) como cita Souza, Denaldi e Santa Rosa (2008), é regida pelos princípios do direito à moradia (CF/88), da moradia digna como vetor de inclusão social, da função social da propriedade urbana, da gestão democrática com participação dos diferentes segmentos sociais e, da articulação das ações de habitação à política urbana de modo integrado às demais políticas sociais e ambientais. A PNH tem como principal objetivo promover as condições de acesso à moradia digna para todos, especialmente para os segmentos de baixa renda, historicamente excluídos, com os quais há uma enorme dívida a ser resgatada.


Em contrapartida à compreensão, a história ambiental brasileira firma-se na década de 90 com a criação da Secretaria Nacional de Meio Ambiente, que posteriormente transforma-se em um ministério. Diversas legislações são publicadas especialmente a partir de 1980; sendo nesta transição de décadas que se estabelece a terminologia ‘Desenvolvimento Sustentável’; o termo ganha uso em diversas correntes e discursos.
Não se pode esquecer que o espaço natural é um delineador próprio das formas urbanas de uso do solo. Sendo que na questão ambiental, se associa o saneamento ambiental e usos múltiplos dos recursos hídricos. A água é um elemento que historicamente levou o homem a escolher os locais para sua fixação. Hoje se compreende que os rios têm zonas de proteção e que os usos devem respeitá-las, sob consequências caóticas nas ocupações urbanas. Surge também uma nova área de referência ambiental:  Em 1997 define-se pela Política Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos a Bacia Hidrográfica como unidade físico-territorial de gestão.


Existem políticas que prejudicam uma etnia, como o descaso público com as favelas = culminando na terminologia "racismo ambiental". Sendo uma inovação na legislação ambiental e de recursos hídricos a chamada "gestão participativa". Mesmo quando não é contemplada a sociedade tem se manifestado - se envolvido de forma mais opinativa nos espaços urbanos de seus interesses - e também sofrendo com os efeitos da ausência de um planejamento participativo.
Uma aliança “sui generis” entre uma geração de classe média, de motivação democrático-radical, lideranças políticas liberais democráticas, grupos representativos dos setores mais excluídos da sociedade e grupos alternativos (terceiro setor, religiosos), aponta para uma nova configuração de forças nas grandes metrópoles do País, o que possibilita uma presença ativa dos cidadãos diante de situações que antes eram deixadas na área específica de um poder patrimonialista, e hoje permitem intermediações entre Governo e Sociedade, em condições de influenciar decisões que convêm aos interesses da maioria (Merino, 1994; Touraine, 1994).

Vaneigem (2002) desenvolve um trabalho primoroso e de complexa, mas necessária compreensão, ao sentido das relações de satisfação humana, sentido da vida, economia e ecologia. Diz que o anúncio para a vida-sociedade é, assim, uma densa rede de ocorrências/discurso que consegue destacar lugares-limite [um ‘sistema nervoso’ central (material-gregário-urbano) e social de articulação à sobrevivência)], salientando que, em cada etapa de abertura de poder (es) está um desenvolvimento que ‘seria possível’, assistindo a uma reformulação de ambos os estados de cotidiano e do universo (material e simbólico) configurando numa forma de convivência social.

Estudos sobre metrópoles combinam-se na integração ao sentido de compreensão da questão ambiental, avaliada por exemplo,  pelo bio-indicador ‘água’ ou por outra denominação ‘meio ambiente’. A explosão e nascedouro de novos centros e regiões reforçadas pela caracterização de ‘metrópoles’ é extremamente bem descrita por Maricato (2006) (2001) e estudos desse autor, traduzindo que a representação ideológica das cidades no Brasil tem insistido na construção de uma imagem hegemônica calcada nos espaços conferidores de distinção e fortemente influenciados por símbolos internacionais. Ela, essa representação, acaba por ocultar os mencionados espaços ilegais e segregados. Fortemente associados aos expedientes de valorização imobiliária. Um universo gigantesco e desconhecido traduz-se na produção de favelas. De acordo com Maricato (2006) houve um crescimento preocupante da população brasileira moradora em favelas; isso em uma década (1981-1990) com dados ‘questionados’ numa estimativa de até 70%. A marca de ilegalidade e a consequente ausência de direitos e total controle sobre o uso e ocupação do solo é que vão determinar grande parte do estigma que acompanha as áreas ocupadas por favelas. Desenha-se um processo complexo de ‘exclusão’. O solo parece constituir a base para uma vida ilegal esquecida pelos direitos e benefícios urbanos. Outra conseqüência grave que decorre do crescimento de favelas diz respeito ao meio ambiente. A localização das favelas se dá mais frequentemente em áreas ambientalmente frágeis: beira de córregos, fundos de vales inundáveis, áreas de mangues, encostas íngremes, áreas de proteção ambiental, entre outras. Maricato (2006) e textos mostram que há uma aparentemente estranha coincidência entre a localização das favelas e os recursos hídricos.


Fazendo um contraponto, em aproximação, à linguagem de Vaneigem (2002), não tão simples: cada ser «orgânico» é assumido como uma nova fonte de alimentar empregos e atrelada à bandeira da viabilidade econômica, que por outro lado, contesta a relevância e rejeição de uma produção (que deve ser regida pelo valor da mudança), pois a população cresce, e gera resíduos de forma ‘natural ‘ e mecanicamente inevitáveis. O autor mostra um olhar diferente, onde o mundo não pára (a idéia de dinâmica nos tecidos urbanos), mas a sua economia planejada para projetar maneiras de permitir sobrevivência e convivência para eliminar a dor e diminuindo a articulação do senso criativo. Aborda temas envolvendo: o homem natural e homem econômico, a preponderância das mulheres, os homens da economia, a sobrevivência dos homens, o anel de exploração agrícola e a imobilidade, a mobilidade empresarial, mecanização e declínio econômico da terra e do corpo, destruição da vida colocada na máquina da vida (um ser humano em declínio).


Um universo refletido nas bases da ciência desenvolvida para a saúde individual e coletiva, à integração aos padrões de existência humana e ocupações de áreas ambientalmente não vocacionadas para a moradia concentrada. Um caminho para leituras, combinação de experiências com pesquisadores, aprendizado e busca pela consolidação de linhas temáticas de produção do conhecimento (demanda de projetos sócioambientais).

A lógica da realidade encontrada para as formas e condições de ocupação territorial e, tentativas de adequá-lo, é, mormente, balizada pelas ofertas tecnológicas e processos de urbanização, próprios para a resolução de satisfação de demandas: como integração de políticas, criação e propostas de Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) como resultado de experiências positivas, propositoras de integração comunicável ao zoneamento predisposto no Plano Diretor. Isto pois, numa visão contemporânea dos estudos em Planejamento e Gestão do Território.

Parâmetros para Projetos

Resultados discutidos em um Seminário Nacional sobre Plano Local de Habitação de Interesse Social aponta para um diagnóstico as necessidades habitacionais da produção de novas moradias.
Onde as necessidades habitacionais se sustentam nos conceitos de:

- Déficit habitacional ou déficit quantitativo;
- Inadequação ou déficit qualitativo;
- Demanda demográfica.

São fontes para os cálculos e intrepretação em projetos: IBGE; CEM-CEPRAP; Informações Municipais; Levantamento cadastral (em campo); Contagem de domicílios; Aerofotogrametria; Imagens de satélite; Combinação de fontes (alternativas metodológicas).

A favela é classificada como déficit quantitativo e qualitativo.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2000) lidou com domicílios improvisados, co-habitação e ônus excessivo.  E estudos trabalham com a classificação de dois universos - setores censitários com e sem assentamentos. Para a questão da inadequação se tem adensamento excessivo, ausência de unidade sanitária interna ao domicílio, carência de infra-estrutura (devendo se usar um fator de correção).

Os governos têm o enfrentamento de situações de riscos denominadas "não solucionáveis" - como o densadensamento, restrições legais (APP por exemplo), interface com grandes obras viárias e de infra-estrutura, além de outras.
Sendo necessidades para os investimentos habitacionais:
- Terra urbanizada;
- Novas unidades habitacionais;
- Urbanização;
- Regularização;
- Melhorias habitacionais;
- Eliminação e gerenciamento de riscos.

Usando um exemplo quanto à Terra Urbanizada, para parâmetros de importância:
- Identificar a quantidade de terras para a produção de habiração social;
- Padrão de ocupação: lote mínimo, índice de ocupação, densidade)
- Características do terreno: morfológicas e ambientais;
- Identificar a localização das terras (vazios habitacionais);
- Delimitação das terras: Zonas especiais de interesse social (ZEIS) segundo o Plano Diretor; ZEIS (lei específica ou complementar); PLHIS ou ZHIS ou HMP - zonas de habitação de interesse social ou habitação para moradias populares. Áreas necessárias versus demanda de novas unidades - em adequação com a regularização fundiária.

Sendo o Plano Diretor tido com instrumento de ampliação do acesso à terra nos mecanismos: Delimitação de ZEIS (áreas vazias); PEUC - Notificação para parcelamento de Edificação e Urbanização compulsórias; parâmetros especiais para produção de HIS - HMP (habitação de interesse social e habitação popular); Conselho municipal de Política Urbana; e outros como - Consórcio imobiliário e Direito de Preempção, Identificação de Marcos Regulatórios.

Os custos estão relacionados com:
- Padrão construtivo;
- Solução de integração com o bairro;
- Padrão de urbanização;
- Condições especiais (como próximas a rios)
- Características da cidade e região.

A oferta habitacional se prediz com:
- Disponibilidade do solo urbanizado;
- Produção de moradias pelo setor público - federal, estadual e municipal;
- Produção de moradias pelo setor privado (mercado imobiliário)

O exemplo da cidade de 32 milhões de habitantes
(O Estado de São Paulo, 03/08/2008)

"Transformar em exemplo de urbanização uma 'cidade' pobre, poluída e com 32 milhões de habitantes espahados por uma área do tamanho da Áustria (82,3 Km2)parece tarefa hercúlea até para os determinados tecnocratas chineses. Mas é isso que eles tentam fazer desde 1.997 em Chong-Qing, para torná-la o motor do progresso da paupérrima região centro-oeste da China."

"Pouco mais da metade dos 32 milhões de habitantes está na zona rural; a cidade que dá nome à região tem 6 milhões. A Chongqing antiga, de prédios baixos e casas de bambu sustentada em palafitas, vem sendo substituída por centenas de arranha-céus. O cenário parece construído por peças de quebra-cabeças de caixas diferentes, que não combinam entre si. Desde 2001, o município transferiu mais de 1,4 milhão de pessoas que viviam em regiões alagadas pela represa de Três Gargantas, que ocupa uma extensão de 600 Km ao longo do Rio Yang-Tse."

"O local que se transforma mais rapidamente em Chongqing é o distrito de Jiangbei, de 1,61 Km2. Das 500 maiores empresas do mundo listadas pela Revista Fortune, 57 têm escritórios nessa área. O distrito ganhou 6,5 milhões de metros quadrados de construções entre 1997 e 2007, o equivalente a 30 prédios como o Empire State, o mais alto de Nova York, com 102 andares."

"O governo chinês justifica que o objetivo da megacidade é retirar pessoas que vivem na zona rural em situações precárias.  Um dos jurados da Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo (2007), justica seu entusiasmo lembrando que, nas últimas três décadas, um contigente de 120 milhões de pessoas migrou da zona rural, onde viviam em condições de extrema pobreza, para as grandes cidades chinesas, mas as metrópoles não explodiram em favelas, como costuma ocorrer em outras partes do planeta."

"Chongqing é a visualização do conceito de 'cidade global' definido pela socióloga Saskia Sassen conceitua como ‘cidade global’.- já que objetiva interligar as regiões rurais que circundam o centro de 6 milhões de habitantes e outros distritos, indo ao total de 32 milhões de habitantes, e um investimento até 2021 de U$ 19,5 bilhões."

Um viés: O que é uma cidade? (texto completo clique)

"O antropólogo Robert Redfield, por sua vez, opunha uma sociedade "folk" a uma urbana e acreditava que existissem variações contínuas entre elas, aumentando ou diminuindo de um pólo para outro de seu continuum. Para ele, as consequências do deslocamento em direção ao extremo urbano de seu continuum eram a desorganização da cultura, a secularização e o individualismo. A urbanização enfraqueceria ou destruiria os firmes laços que ele pensava que integrassem os homens em uma sociedade rural e criava uma cultura urbana caracterizada pela fragmentação de papéis sociais e um comportamento mais secular e individualista (Redfield, 1941)."


"O desenvolvimento do modo de produção capitalista, como descreve Marx em "O Capital", aconteceu (após o aparecimento prévio do capital através do comércio no mundo do século XVI) por meio das transformações que ocorreram nas cidades onde as manufaturas foram eliminadas pelas fábricas às quais os servos pediram empregos depois de serem expulsos ou fugirem do campo."

"Lefebvre (1969) definiu a cidade como a "projeção da sociedade sobre um dado território". Essa afirmação parece bastante elementar e, ao mesmo tempo, um ponto de partida indispensável, porque se é necessário ultrapassar o empirismo da descrição geográfica, corre-se o risco de imaginar o espaço como uma "página em branco" sobre a qual se inscreve a ação dos personagens sociais e das instituições, sem encontrar obstáculos, a não ser o "desenho" das gerações anteriores. Isso corresponderia a conceber a natureza como totalmente moldada pela cultura e, assim, que toda problemática social tem origem na união destes dois termos, através do processo dialético pelo qual "uma espécie biológica particular (dividida em classes)", o homem, se transforma e transforma o seu desenvolvimento na luta pela vida e pela apropriação diferencial do produto de seu trabalho."

"Como conceito, a cidade global funciona no nível dos fluxos econômicos assim como dos imaginários sociais que circulam física e virtualmente pelos quatro cantos do mundo. O conceito de cidade global traduz o que a socióloga norte-americana Saskia Sassen – aliás, quem legitimou essa terminologia – definiu como a "dispersão espacial das atividades econômicas nos níveis metropolitano, nacional e global que se associa à globalização e que contribui para a demanda de novas formas de centralização territorial das operações de controle e de gerenciamento de alto nível"




                                                                                      
Uma ideia do modelo urbano de São Paulo pode ser identificado em regiões (Figura 1):
 
 
Figura 1 -  Os quatro tipos básicos de macrorregiões da cidade de São Paulo.
                                                                            Fonte: Campos Filho (2003)


     "Durante muito tempo o zoneamento significou um princípio teórico e prático de compreensão e planejamento da cidade – delimitação de núcleos, zonas, ordenanças – e no último quarto de século, essa análise morfológica dos tecidos urbanos, enriqueceu extraordinariamente o ‘simplismo funcionalista’, mostrando a riqueza e complexidade das formas urbanas."


                                                                                    

B i b l i o g r a f i a

Ab’Saber, A. Um breve futuro da natureza. In: http://www.revistaau.com.br/, acesso em 31 de Março de 2009.

Campos Filho, C. M. Cidades Brasileiras: seu controle ou o caos – o que os cidadãos devem fazer para a humanização das cidades no Brasil. São Paulo-SP: Studio Nobel, 2001.

Maricato, E. Metrópoles Brasileiras. São Paulo-SP: Instituto Goethe, 2006.

Merino, M. En busca de la Democracia Municipal: La Participación ciudadana en el gobierno local. México: Colégio del Mexico, 1994.
Rolnik, R. O que é cidade? São Paulo-SP: Brasiliense, 2004.
Rolnik, R. Folha de São Paulo. São Paulo-SP: Entrevista de 30/06/2008.

Touraine, A. Crítica da Modernidade. Petrópolis-RJ: Ed. Vozes, 1994.
Vaneigem, R. Aviso a los vivos sobre la muerte que los gobierna y la oportunidad de deshacerse de ella. Madrid: Ed. Tierradenaide, 2002.
                                                                                                   

Foto da postagem: Vista panorâmica de São Paulo, clique na cobertura do Ed. Itália.

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